Bem
dizem que não se escolhe amar. O amor brota como erva daninha. Mesmo que não se
queira, pague jardineiro, ponha inseticida, teima e brota.
Ufa!
Em
vários níveis se manifesta. O de mãe creio que é o maior exemplo. O dos
parentes, amigos e companheiros vibram em outra frequência. Uma talvez mais
branda quando se vive com respeito ao próximo, aos animais, plantas e lugares
compartilhados.
Quando
criança somos mais transparentes deixando fluir livremente o que sentimos. Vamos
crescendo e os conceitos que vão nos
ensinando, as situações que vivenciamos normalmente vão nos endurecendo, muitas vezes apagando a
chama linda do amor.
Não,
ela não some. Mesmo que se queira eliminar.
Tenho
tido oportunidade de vivenciar vários graus deste sentimento ao longo do meu
meio século e ainda me surpreendo com minhas reações.
Por
mais dura que imponha, meu olhar me entrega. Fico agoniada quando a raiva em
uma situação impera no momento e sou grata que não perdura.
Mais
de uma vez me senti fora do mundo por ver o lado bom das pessoas, inclusive das
"declaradamente" ou "rotuladamente" ruins.
Constatei
várias vezes que esse meu lado mais me prejudicou do que ajudou. Sou
transparente no olhar e ponto final.
Aceito
que não guardo rancor e com certeza é uma forma de amor.
E,
hoje, na concepção atual neste mundo, chego a pensar que não é qualidade.
Não
sou burra e vejo a Lei da Vantagem prosperar. Que se puder tirar vantagem do
bobo ou boba cidadão não há hesitação.
Como
sempre escreve um colega "Só observo..."
Enfim,
sei que não vou mudar. É da minha essência.
Tive
a certeza disso revendo fotos minhas desde criança. O olhar transparente e
crível.
Ontem,
foi outro exemplo, no modo negativo. Fiquei muito mau por constatar que fiquei
com raiva de uma situação vivida no trabalho com uma pessoa que vive nas ruas e
que se droga. Sempre opto por solucionar na paz e conversar nestas situações,
objetivo que não pode ser alcançado. Em plena 6:29h da manhã o problema surgiu
no balcão da lanchonete. Conversa vem, conversa vai, acordo nenhum, salão
lotado e mãos atadas. Chamei a segurança que quando chegou não resolveu de
imediato. Ou digamos, paliativamente, pois não permaneceu no local. Assim que
partiu a pessoa problema voltou. Uma vez, outro chamado, outra solução parcial,
outra vez, outro chamado... Cansada, vendo a pessoa ir abordar os clientes nas
mesas fui ate ela argumentar. Fui falando educadamente que ele tinha sido bem
tratado, tinha ganho comida da empresa, de outros clientes (essa é outra
história...) e que se ele poderia ir embora (não falei do cheiro terrível que
ele exalava, pois não teria como, geraria mais problema...). Não fiz mais que
uma pessoa educada e paciente faria. De repente, ele que se fazia de bobo falou
que tinha obrigação de dar as coisas para ele e me empurrou!
Tá,
eu sei que se ele fosse normal, não viveria na rua e nem escolheria esta opção.
Não
revidei, recuei, deixei ele no salão e chamei a policia.
Acabou
tudo bem. Mas apesar de ler nos olhos dele a indiferença, o simplesmente o
nada, saber que minha reação foi de raiva, indignação, medo e vulnerabilidade.
Por uns instantes senti e queria o fim dele.
Mas
quando a policia chegou e perguntou se eu queria que "dessem um pau
nele", porque ele vivia atormentando os estabelecimentos, que ele era
louco e não dava para prever a reação. Fiquei estarrecida e ao mesmo tempo não
quis essa solução. Não é esta a solução. É um ser humano.
Muito
confusa e nervosa fiquei o dia todo. Ainda estou com misto de pavor e amor ao
próximo.
Puxa,
tem que ter uma solução para isso, e não é a violência.
Não
vou ser eu a autorizar. Mas por ser assim sei que outras situações vão ocorrer
e minha voz interior vai falar mais alto.
Uma
terapeuta um dia me falou que "Quanto mais a gente se abaixa mas chutam o
nosso traseiro".
Não
concordei com a crueza da frase. Porém é o que se percebe vendo os jornais e
convivendo atualmente neste mundo.
Chego
a ter dúvidas se nasci na época ou no planeta certo. Me sinto uma ET.
Voltando
ao ponto, sempre tive este sentimento, nunca eu distingui ninguém por credo,
classe e crença.
Já
endureci o coração para me esconder dos meus sentimentos. Porém sou grata por
não conseguir manter a farsa.
Vendo
minhas fotos desde pequena, analisei tudo que vivi, obtive certezas e deixei
coisas para lá. Mantive as boas. Reconheci sentimentos perdidos e achados. Vi
que todos tem lugar e tinham que ter acontecido e acontecer. Uns as chaves dos
baús puderam ser fechadas, outros não vão ser fechadas nunca, tenho certeza.
Mesmo
hoje que o rapaz drogado voltou sem estar drogado, não fez nada, não me
arrependi de não ter autorizado violência.
Espero
estar certa. Sou coração e amor e não vou mudar.
Sandra
Lazzaris